quinta-feira, 28 de abril de 2011

A Verdade por Trás do Ranking dos 50 Melhores Restaurantes do Mundo

Como já dissemos em algumas de nossas postagens, nossa função não é julgar. Mas algo precisa ser esclarecido. Muitas pessoas se perguntam: "Realmente o D.O.M. é um dos dez melhores restaurantes do mundo?". Com frequência ouvimos por aí frases do gênero: "Só de cabeça, eu sei dizer vinte restaurantes melhores do que o D.O.M.". Muitos, ainda consideram o FASANO, em sua excelência no que diz respeito a elegância, comida e serviço, um restaurante melhor que o do chef Alex Atala.
O texto abaixo é da Alexandra Forbes, jornalista e blogueira, aficcionada por gastronomia. Ela cobre os principais eventos internacionais sobre o tema, é muito respeitada e é referência na área.


“Cinquenta Melhores Restaurantes do Mundo? Quem Falou?” Com esse título, artigo recente da jornalista Lisa Abend, no The New York Times, jogou uma bomba no seio da organização inglesa que anuncia, anualmente, um ranking chamado, justamente, “Os 50 Melhores Restaurantes do Mundo”. A lista dos vencedores deste ano foi revelada com grande pompa no último dia 18, em Londres: o dinamarquês Noma em primeiro, El Celler, de Can Roca, na Catalunha, em segundo, Mugaritz, no País Basco, em terceiro e o D.O.M., do chef Alex Atala, em sétimo – uma proeza! Esses festejavam, enquanto outros, nos bastidores, esbravejavam. Os descontentes tinham a seu favor certos argumentos levantados pelo jornal, como os convites de chefs para bocas-livres que acabam rendendo votos a seu favor ou – ainda pior – jurados que sequer foram comer nos restaurantes para os quais votaram.

Que há podres como esses, e outros ainda, ninguém disputa. Afinal de contas, trata-se de uma lista composta a partir de votos secretos de 837 pessoas que não são apenas jornalistas especializados e gourmands, mas também chefs e restaurateurs. Enquanto de jornalistas espera-se mais imparcialidade (pelo menos em um mundo ideal), seria inconcebível pensar que chefs e restaurateurs não dariam uma “forcinha” aos amigos, ou aos conterrâneos. Claro que dão!

Se os votos corrompidos de um e de outro influenciam os resultados, o que mais faz subir a cotação de um restaurante é algo mais intangível, o “fazer parte do circuito”. Essas 837 pessoas que decidem o futuro de tantos chefs – e nisso me incluo, já que integro o júri há cinco anos – votam em restaurantes onde comeram recentemente, e não necessariamente naqueles onde fizeram as melhores refeições de suas vidas. Por exemplo, embora tenha jantado esplendidamente no Atelier de Joël Robuchon novaiorquino não votei nele, porque isso foi há mais de dois anos (e pelas regras, só se pode votar em lugares visitados nos últimos 18 meses).

Ou seja: onde quer que grande número de jornalistas, chefs e gourmands tenham comido recentemente, seus restaurantes irão, coletivamente, subir no ranking. Querem um exemplo? Estive em San Sebastian, no País Basco, em novembro passado, cobrindo o importante fórum Gastronomika. Estavam no mesmo evento incontáveis outros jurados – inclusive o “chefe” do júri brasileiro, o crítico Josimar Melo. Todos comemos no Asador Etxebarri, Arzak e Mugaritz. Os três, claro, se deram bem nos 50 Melhores (números 50, 8 e 3, respectivamente). Outro exemplo? São Paulo recebe vários chefs e jornalistas de renome (inclusive jurados dos 50 Best) para dois eventos de gastronomia anuais, o do caderno Paladar e o Mesa Tendências, da revista Prazeres da Mesa. Adivinhem em qual restaurante todos os chefs e jornalistas fazem questão de comer? No tão falado D.O.M., é claro. Daí a comerem bem e darem ao Atala seus votos, basta um pulo.

Um chef cujo restaurante esteja longe dos atuais pólos mundiais da gastronomia – Londres, Paris, Nova York, Tóquio, País Basco, Catalunha, São Paulo – sai perdendo, pelo simples fato de que se poucos jurados chegam até ele, poucos poderão votar nele. Simples assim. O chef Quique Dacosta, cujo restaurante homônimo fica na pequena Denia, no Alicante, sul da Espanha, me confessou na noite da premiação: “Preciso que mais votantes venham até Denia!” Eu o considero um dos mais geniais de sua geração, mas seu restaurante amargou com a 51a. posição. O Mugaritz, de seu conterrâneo Andoni Aduriz, faturou o 3o. lugar no ranking mundial, e no entanto sequer consegui comer alguns dos pratos que me serviram lá, de tão inapetitosos.

Injusto? Sim. Mas existe algum ranking 100% objetivo? Será possível elaborar regras e critérios que pareçam corretos para todo mundo? Melhoraria algo retirar chefs e restaurateurs do júri, deixando a decisão na mão de jornalistas e “food lovers”? Duvido. O ranking dos 50 Best deve ser visto não como uma declaração absoluta de que tal restaurante é melhor do que tal. A lista não define de fato os MELHORES restaurantes, mas sim os mais em alta – e digo isso no bom sentido. Trata-se de um excelente retrato de quais restaurantes mereceram, no último ano, mais atenção e elogios por parte de entendidos de gastronomia.

Mesmo com todas as suas falhas, a lista The World’s 50 Best Restaurants está aí para ficar. Hoje tem um poder monstruoso, muito maior do que qualquer revista ou guia – inclusive o Michelin. Quando o dinamarquês Noma foi eleito número um no mundo, em 2010, da noite para o dia centenas de milhares de pessoas passaram a ligar e escrever implorando por uma reserva. O americano Grant Achatz, do Alinea, em Chicago, conta em sua recém-lançada biografia Life, On The Line:

“Em maio de 2010 fui a Londres para a premiação do The World’s 50 Best Restaurants. Alinea subiu para a sétima posição no ranking, mas ainda por cima foi nomeado o Melhor Restaurante na América do Norte. No dia depois do anúncio jornais de todo o país noticiavam o Alinea como “o melhor restaurante da América”. Pessoas ligavam no restaurante dizendo que nosso site tinha saído do ar. Meu sócio me mandou um texto em Londres: “Servidores caíram. Cinquenta mil pedidos de reservas na última hora! Telefones não param de tocar”. O sonho de qualquer chef ou restaurateur, certo?

Que conselho eu daria aos que estão no business e falam mal do ranking, que esperneiam por achá-lo injusto? Diria a eles: “ao invés de remarem contra a maré em vão, mexam-se!” Apresentem-se em fóruns internacionais, mandem cartas de apresentação e press kits para críticos importantes, recebam figuras internacionais como chefs-convidados, apareçam na mídia e na internet, estabeleçam relações pessoais com chefs de relevância. A dura verdade é que entrar para a tão almejada lista dá muito trabalho, e manter um restaurante sempre no mesmo alto nível de excelência não passa do primeiro requisito. O segundo, gostem os chefs ou não, consiste em conseguir atrair o maior número possível de jurados a provar sua cozinha...

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